quarta-feira, 20 de julho de 2011

Se o seu site está cheio de babacas, é culpa sua

Recentemente, li este post, o qual toca em alguns aspectos bem interessantes sobre as premissas que o autor considera necessárias para o sucesso de uma comunidade virtual.

O argumento de muitos sites é o clássico não temos responsabilidade sobre os comentários postados. Ele pode ser válido de um ponto de vista legal, mas não de um ponto de vista moral: você é responsável sim pelos comentários do seu site. Você possibilitou que ele fosse usado para apologia ao crime, para promoção do ódio, e isso está no seu domínio ou no da sua empresa. 

Vamos aos 5 pontos suscitados no post:

1. Você deve ter humanos de verdade dedicados a monitorar e responder à sua comunidade

Começa por aí: muitas comunidades, fóruns etc... não possuem moderação ativa. Ter uma comunidade cheia é um símbolo de status, um e-penis. Mas a parte chata, de ler e participar ativa e sistematicamente dela, de reconhecer comportamentos e expulsar usuários bagunceiros, e ninguém quer.

As tarefas de moderação podem (e devem) ser divididas entre vários usuários, desde que eles aceitem as responsabilidades que isso implica, e não simplesmente usem isso para mostrar ó, eu sou foda, sou moderador de uma comunidade com 50 mil membros.

2. Você deve ter políticas na comunidade sobre o que é e o que não é um comportamento aceitável

Também é uma falha de planejamento das comunidades. Muitos donos e moderadores não definem regras, ou quando elas existem, não as fazem acontecer ou valer.

Aplicando ao Orkut e outras redes sociais, parte dessas regras poderia ser justamente a proibição de perfis falsos, algo que (in)felizmente irá atrair haters, pois já não se torna possível inflar comunidades (considerando que os donos das comunidades são coerentes com as regras que eles estabelecem), e para algumas pessoas que tem medo de dar a cara a tapa pela sua opinião, preferindo ficar escondidas atrás de um fake.

Outra parte dessas regras deveria versar sobre erros de linguagem, vocabulário aceitável, menção e uso de informações pessoais, e outros comportamentos relevantes.

Regras devem ser claramente definidas, em palavras exatas e simples, porém devem ser interpretadas de forma flexível, para evitar infratores tentando se esquivar e alegar que o comportamento deles não estava definido nas regras. Também não se deve poupar moderadores e usuários mais avançados delas, para evitar a ilusão de eu posso, eu cheguei aqui antes.

3. Seu site deve permitir identidades confiáveis

Novamente entra na questão dos fakes e do incrível poder da anonimidade por eles fornecida. E muitas vezes, ela é exatamente usada para fins inadequados, inclusive, várias vezes já vi pessoas que postavam anonimamente porque se eu colocar meu perfil aqui, eles vão me encher o saco.
 
Comentários anônimos são válidos em algumas situações específicas, por exemplo, proteção à identidade - o que não é o caso de uma rede social ou de um fórum, obviamente. Logo, ela torna-se injustificável e até mesmo perigosa.

O autor do post propõe o uso de pseudônimos permanentes - como vemos na maioria dos fóruns: não é necessário que o usuário mostre o seu nome, apenas é necessário que ele mantenha o seu apelido. Mas, quando necessário, não se deve ter medo de mostrar o nome real dos usuários.

Também é considerado o uso de sistemas de reputação, não baseados em pontuação ou número de posts (o que levaria muitos a floodarem ou responder 'sim' a qualquer coisinha), mas sim no comportamento do usuário. Não na quantidade, mas sim na qualidade.

4. Você deve ter a tecnologia para facilmente identificar e impedir comportamentos inadequados

Nas redes sociais mais utilizadas, essas ferramentas são limitadas ou inexistem. Mas muitos outros sites, principalmente os de notícias, usam ferramentas desenvolvidas sob medida, e não há justificativa para o não uso de buscas por palavras-chave, análises estatísticas etc... para detectar comentários irrelevantes. Inclusive, as mesmas técnicas que os filtros anti-spam empregam são aplicáveis.

5. Você deve ter condições para permitir ter uma boa comunidade, ou deve procurar outro ramo de trabalho

Evidentemente isso não se aplica para aquelas comunidades pequenas, ou para blogs pessoais atualizados apenas ocasionalmente. Mas para os blogueiros profissionais, aqueles que publicam regularmente e lucram com propaganda e parcerias no seu blog, ou para fóruns maiores, não há pretexto para não ter o mínimo de filtragem nos comentários.

E essa afirmação é muito mais válida para os grandes portais: para esses, inexiste qualquer motivo para deixar o caos consumir as suas comunidades. Dinheiro há de sobra, desenvolvedores e recursos técnicos também.

Ou mesmo, se você não tem as condições para garantir o cumprimento de todos os itens, é válido desativar os comentários - o que já é feito há muito tempo por blogs técnicos ou científicos. Dado que muito do compartilhamento hoje se dá pelas redes sociais, percebo (observação não-científica) que eles se tornam relevantes apenas para discussões prolongadas - as quais podem ser feitas em outros meios.

Isso tudo pode ser aplicado a diversos sites. Atualmente, é impossível ler os comentários do Terra, do G1, de vídeos famosos no YouTube etc... sem encontrar:

  •  Alguém conseguindo interpolar os direitos dos homossexuais ou que "viados são a abominação do diabo" (sic), ou alguém falando em Deus ou religiões. Em ambas as situações é possível constatar tentativas de burlar censores: es/cre-ve.se$ass/im, troka-ce l3tras etc...
  •  Pessoas demonstrando total desconhecimento do assunto da notícia, ou simplesmente de mimimi.
  •  Corajosos de internet posando de justiceiros e propondo soluções fantásticas e que não funcionam para os problemas.
  •  Gente que ainda acredita na história de que a internet é uma terra anônima sem leis e normas.
  •  Fanboys e hateboys duelando epicamente entre si para saber quem é mais barulhento, abafando qualquer discussão sensata que poderia vir a acontecer.

De um ponto de vista puramente comercial, essas "polêmicas" geram lucro. Geram mindshare, geram acessos etc... Isso é bom para o site, e portanto eles dificilmente vão filtrar o conteúdo - até a hora em que eles vêem sua imagem prejudicada e precisam repintá-la.

Você é responsável pelo conteúdo dos comentários do seu blog sim. Você é responsável pelo conteúdo dos anúncios dele [1], e os anunciantes são responsáveis por conhecerem o lugar onde eles anunciam - nenhuma empresa séria gostaria de ver seu anúncio em um jornal ou site que prega o ódio, certo?




Se o seu site está cheio de babacas, e você não fez seu dever de casa, é culpa sua. Não adianta chorar e dizer que a internet odeia você ao mesmo tempo em que deixa o caos imperar no seu site.

[1] Um exemplo que sempre gosto de comentar é um site ou publicação de uma organização ambiental aceitando anúncios de uma empresa do agronegócio conhecida por fazer greenwashing. Sinceramente, não consigo confiar numa organização que contradiz seus ideais por dinheiro.

Imagem do post: http://xkcd.com/386/

sábado, 16 de julho de 2011

Onde o Orkut, e seus usuários, erraram

Cada vez menos uso o Orkut. Tenho ele para ler algumas comunidades e ocasionalmente interagir com alguém que ainda não me tenha adicionado no Facebook ou que não me siga no Twitter, mas isso é raro. Considero aqui alguns motivos que me levaram a abandoná-lo: 

1. Comunidades? Que comunidades?

Adianta ter uma comunidade com 5 milhões de membros se:
  • tudo o que tem nelas são jogos do tipo "beija ou passa?", "continue a história com 3 palavras", "me add", trollagens etc... não há um fluxo de ideias real simplesmente por não existir comunidade!

Noto (observação não-científica) que comunidades on-line centradas num tema, e apenas nele, tendem a ser menores. Fóruns podem ter milhares, dezenas de milhares de usuários, com algo em comum, que é o interesse num tema - mesmo no Orkut constatamos isso, comunidades mais técnicas ou mais focadas tendem a ser menores. E essas comunidades ainda falham em alguns aspectos, básicos para qualquer sistema de discussões (fórum, mailing list, newsgroup etc...):
  •  não há uma ferramenta de "quote" (o que é necessário para a comunidade efetivamente ser um fórum), a formatação de textos muitas vezes é quebrada;
  •  os posts são limitados a 2048 caracteres (inviabiliza um texto mais longo, uma discussão mais comprida etc...);
  •  90% das comunidades são somente para membros (ou seja, quero ser um mero lurker, mas não posso, preciso engrossar a lista de usuários).
Felizmente o Orkut tomou medidas contra o roubo de comunidades, proibindo a troca de nome: antigamente essa prática era muito comum, justamente para se obter uma comunidade mais antiga. Bombardeava-se o perfil do moderador com denúncias, ou ele era vítima de algum bug ou site malicioso, e pegava-se o cobiçado prêmio: uma comunidade criada em 2005, já com 10 mil membros de brinde.

Inclusive, várias vezes já fui incluído em comunidades pornográficas, obscenas ou nada-a-ver comigo, justamente porque alguém roubou uma comunidade e renomeou.

Muitas das comunidades lá já são irrelevantes. Entrar na comunidade de algum software ou tecnologia? Para quê, se ela já possui um fórum ou lista de discussão mais abrangente, com pessoas de todo o mundo? Não vejo muito sentido.

2. No meio do caminho tinha um CAPTCHA - ou, insegurança e limitações diversas

Quero sair de um monte de comunidades ao mesmo tempo? Não posso. Estou em uma discussão e excedi um limite X de mensagens por dia? Preciso digitar um CAPTCHA. Editei o meu perfil e coloquei um link? Mais outro CAPTCHA. E assim vai.

Em outros serviços também há essas confirmações, mas elas não são comuns. Não lembro de tê-las visto no Facebook ou no Google+, por exemplo, exceto em situações muito incomuns (por exemplo, um flood de links).

Infelizmente essa medida tornou-se necessária devido ao grande número de spams, de malwares entre outros. Por um bom tempo, quando foram relatadas diversas falhas de XSS, usei o Orkut somente com o NoScript - do contrário, corria o risco de ver meu perfil "invadido", e como meu perfil ligava à conta Google, poderia perder meu e-mail (à época eu não separava contas pessoais e profissionais).

3. "Perfil lotado" ou mamãe, quero ser famoso

Já afirmei no meu Twitter que quem tem 5 mil amigos não tem amigos. Mesmo pessoas famosas, ou pessoas que lidam com pessoas, dificilmente chegam a ter tantos amigos - considero que o mais justo nesse caso seria uma fan page.

Como o Orkut não tem esse recurso, vemos celebridades virtuais (e attention whores) criando infinitos perfis. Fazem de tudo para chamar a atenção: participam de jogos me add e saem adicionando todos os novos amiguinhos, que colecionam como figurinhas num álbum. Colocam fotos pesadamente editadas em trajes provocantes, e ao mesmo tempo entram em comunidades não acho um(a) namorado(a) decente, quero amor etc...

Quer conseguir amigos, seguidores etc...? Produza conteúdo de qualidade e relevante: pode não ser tão eficiente em termos de quantidade, mas certamente gera uma rede de contatos de maior qualidade. Ou você está a fim de ter 50 mil amigos e seguidores que não dizem nada?

4. Bobajadas diversas

Scraps abestalhados e perfis coloridos: duas verdadeiras abominações. Que atire a primeira pedra quem nunca recebeu um scrap piscante ou entrou num perfil que expressava toda a individualidade do dono... copiado de um site tipo "perfis prontos".

Outro problema são os fakes. Não aquele fake discreto, mas aquele que claramente é um troll usando a carapuça de uma pessoa cool. É impossível manter uma discussão inteligente com uma pessoa que esconde a cara atrás de uma foto de uma gatinha saturada no Photoshop e que reage a qualquer coisa com sarcasmo e xingamentos.

5. iscrevenu asim, everthng wrng

Diversas vezes eu já desisti de acompanhar um tópico no Orkut por causa dos erros de gramática e de ortografia cometidos. Outras vezes, já me desinteressei por alguém devido ao fato de seu perfil estar totalmente escrito em miguxês ou ela assassinar a língua.

Não é só um problema brasileiro, antes que algum reacionário BRASIL EH UMA MERDA MIMIMI INCLUSÃO DIGITAL MIMIMI, do tipo que povoa o Classe Média Sofre, venha aqui: comunidades cujo idioma principal é o inglês também padecem com pessoas (notadamente os indianos) que escrevem como quem está digitando um SMS: é 'u wrong' pra cá, 'plz add me' pra lá, 'ur good' acolá...

Isso é algo que não vejo em bons fóruns, listas de discussão etc.... Tanto em português quanto em inglês, os usuários ao menos tentam escrever corretamente - e muitas vezes conseguem, sob pena de serem rejeitados, de não receberem resposta ou mesmo de serem repreendidos.

6. "Mamãe, quero ser criativo"

Ah, se eu tivesse um real para cada perfil pronto, para cada invasão de perfil que eu vejo no Orkut... eu estaria ricaço. De tal forma que há sites dedicados a isso: expresse toda sua individualidade e a profundidade da sua amizade (tá, cansei de rimar) pegando um texto pronto, copiando, colando e só colocando o nome do seu melhor amigo.

7. Falta de consistência

Uma das coisas que sempre elogiei no Facebook é a padronização: todos os perfis têm o mesmo formato para interesses e gostos, têm direito a um username (melhor do que dizer "me procura"), todos os grupos têm os mesmos recursos etc... em uma interface simples, limpa e gostosa de usar. E é exatamente essa simplicidade que faz falta no Orkut.

O Facebook, o Google+, etc... apesar de todas as outras falhas e limitações, conseguiram - ao menos para mim - se demonstrar melhor que o Orkut, justamente por não terem os recursos problemáticos ou terem implementado eles de uma forma mais sensata. Se eles verão a suposta orkutização (a qual até hoje é um mito hipster, ao menos para mim), só o tempo poderá dizer - duvido muito, devido a curva de aprendizagem envolvida, suficiente para espantar muitos usuários leigos.