Recentemente houve uma motivação da internet brasileira pelo movimento do preço justo, que para muitas pessoas virou o movimento do queremos gadgets mais baratos. Além da inefetividade desses protestos on-line (servem para mobilizar a população talvez, mas têm valor legal nulo), temos outras coisas a mudar antes de querer jogos e gadgets mais baratos.
Vamos a um fato: Gadget não é produto de primeira necessidade. Pode ser importante para uma sociedade conectada, mas está muito longe de ser algo fundamental e necessário. Adianta tablet e colocar tudo na nuvem quando a conectividade à internet ainda não chegou a todos os lugares, nossas operadoras de celular são péssimas, etc... ?
Sabemos que o Brasil tem uma séria carência de inovação tecnológica e de pesquisa e desenvolvimento nas empresas. Não temos condição de ter um produto competitivo se compararmos com a China, onde os impostos e custos são baixos. Não quero defender o modelo horrível de industrialização chinês, mas por quê não reduzem o preço (tanto no aspecto impostos, quanto nos subsídios) de componentes eletrônicos, máquinas e ferramentas industriais, softwares que a indústria usa etc...? Seria um bom passo para criar uma indústria moderna, fabricando tecnologia de ponta aqui.
Não temos profissionais capazes de projetar tablets, smartphones etc... aqui? Certo que temos. O problema é fazer isso quando um componente que lá fora sai por US$1, chega aqui custando R$ 10. Simplesmente não há competitividade, especialmente com uma China que não respeita direitos autorais, trabalhistas ou ambientais. Óbvio que não podemos desrespeitá-los, mas podemos sim baixar os impostos sobre as matérias-primas e incentivar as boas ideias.
Por quê não taxar junk-food, cigarro, bebida alcoólica, agrotóxicos etc... e cortar os impostos dos produtos e alimentos produzidos de forma sustentável? Criar uma taxa que puna os carros e veículos mais poluidores, assim fazendo com que as pessoas que ainda pensam que não existe poluição, é bobagem etc... paguem sua poluição pelo bolso? Que "recompense" quem compra produtos fabricados localmente, quem troca aquela geladeira de 40 anos atrás por um modelo mais eficiente, quem economiza energia, ou quem troca a carne por alternativas mais limpas? Sustentabilidade para as massas, de forma que elas sintam no bolso a vantagem.
Comprar software? Quem tem cartão internacional pode muitas vezes comprar por download. E mesmo que você não possa pagar, para 90% das necessidades de muita gente por aí existe software livre ou mesmo alternativas de menor custo.
E mesmo que os impostos sobre jogos sejam baixados, vai adiantar muito para o carinha que compra 5 por 10 real no camelô ou baixa terabytes de jogos piratas num único torrent, ou que faz todas as suas compras no Paraguai ou de fontes duvidosas? Se baixar os preços dos softwares e dos gadgets, vai realmente haver impulso para a legalização, ou simplesmente vai se aprofundar a nossa dependência de tecnologias restritivas e atoladas de DRM? Se os impostos baixarem, ainda vai haver desculpa para a vista-grossa que se faz em relação à pirataria?
Por fim, quem garante que a redução de impostos será de fato repassada ao consumidor em sua totalidade? Prevejo empresas simplesmente reajustando os preços e lucrando mais. Ou mesmo comemorando a redução do custo operacional e portanto... mais lucro, sem que nenhuma melhoria aconteça para os usuários.
Já tivemos há algum tempo atrás uma redução de impostos para carros, e a consequência foi que muitas pessoas compraram e deixaram de usar o transporte coletivo de pobre. Enquanto isso, quem não dirige sai prejudicado devido ao quase sucateamento dos transportes públicos. Onde estão os incentivos fiscais para ônibus, trens, etc...?
O que é mais importante? Reduzir impostos sobre gadgets e jogos, apenas para incentivar o consumismo de produtos com obsolescência programada e que restringem a liberdade dos seus usuários, sem que com isso haja um retorno para o país, ou reduzir os impostos daquilo que é bom para a sociedade e o país - explorar boas ideias aqui, gerar empregos, preservar o meio-ambiente etc...? Certamente a segunda opção, mas ela não é tão chamativa para a maioria das pessoas.
Nota 1: Antes que comentem sobre o preço dos livros, lembremos que eles não pagam impostos. Os altos custos deles são culpa da ganância inerente as editoras, que fabricam novas edições incompatíveis com as outras, apenas para obrigar bibliotecas e professores a comprarem livros novamente e dificultarem a situação de quem quer comprar livro usado. O problema não é só brasileiro, basta ir na Amazon e procurar livros lá - igualmente caros. E-books provavelmente não vão resolver o problema, devido ao DRM - um preço muito grande para quem não usa Windows ou Mac, mas esse não é o mérito desse post.
Nota 2: Entendo que o movimento quer reduzir os impostos sobre vários produtos, mas por quê não vemos protestos reduzam o preço dos componentes eletrônicos ou reduzam os impostos sobre os alimentos orgânicos? Certamente é por não haver tanto apelo para a molecada que pensa estar fazendo um grande serviço assinando num sitezinho aleatório.
Concordo com tudo isso ai, e sou a favor da inclusão digital e de um país sem barreiras para a informação e o conhecimento.
ResponderExcluirSabemos que o Brasil tem uma séria carência de inovação tecnológica e de pesquisa e desenvolvimento nas empresas. // Certo
ResponderExcluirNão temos profissionais capazes de projetar tablets, smartphones etc... aqui? Certo que temos. // Temos?
Gente com potêncial criativo e inovador sendo massacrado pela academia e seus rigores escrotos (Cobram, mas não dão estrutura pra você ficar forte - vide a greve da sua biblioteca ai), Pós-docs concursados com projetos de merda e com medo de inovar (Como foi o caso disso - http://sourceforge.net/projects/setfon/ - que eu trabalhei FORA DA ACADEMIA para desenvolver um motor inovador de análise de fala e virou uma interfacezinha em PHP para o Praat, com direito a verba do CNPqapim) e muitas acusações de plágio de artigos e teses.
O Brasileiro pode até ser inteligente pra caramba, mas falta nos que estão no auge da carreira inovação, coerência, colaboração, ética e outras coisas que não preciso mencionar aqui