Recentemente, apareceu na mídia o caso da mulher condenada a uma multa milionária por baixar 24 (sim, apenas vinte e quatro) músicas, ou dois CDs (que, em uma loja, custariam muito menos). Algumas emissoras, como a Globo, comemoraram, ainda que implicitamente, esse fato.
Extrapolando essa estatística, se fôssemos contar todas as músicas (e filmes, softwares, livros etc...) baixados no Brasil, e condenar todos (inclusive o nosso glorioso Senado, com seu servidor pirata interno), provavelmente seríamos todos obrigados a pagar uma multa maior, muito maior, que o nosso PIB.
Além disso, um político (ironicamente, ligado a uma Igreja que possui uma gravadora e uma emissora de TV) recentemente propôs uma lei que faria com que o usuário violador de copyright tivesse sua conexão suspensa (ao modelo francês, que, por sinal, foi pesadamente criticado e revogado a alguns dias atrás).
A partir dessas, surgem alguns questionamentos. Sobre a primeira parte:
- Por favor, me mostrem uma gravadora ou estúdio de cinema famoso (pois são eles os que mais reclamam) que tenha ido à falência e por causa da pirataria, de forma a me permitir mudar minha opinião de estarem elas reclamando de barriga cheia, exatamente como uma pessoa gananciosa, nunca satisfeita com o que ganha e sempre precisando pisar em outros (inclusive em artistas, tratados como produtos descartáveis por elas: acabou a modinha? é hora de jogar fora e convocar todos os executivos e publicitários, verdadeiros engenheiros da arte de enganar e criar ilusões, para fabricar mais outra) para satisfazer seus interesses?
- Se as gravadoras são tão afetadas assim, por que motivo elas gastam cada vez mais para fabricar modinhas de sucesso (pois, na publicidade, quase não há limites para o gasto, desde que o retorno seja bom - como normalmente é)?
Normalmente, espera-se que quem está em crise economize e não gaste em futilidades como megaproduções de "artistas" de terceira linha, vendidos como objetos brilhantes "da moda" em revistas ou sistematicamente martelados no rádio ou na TV. Como isso não acontece (ao menos nada que tenha saído na grande mídia), diria que as supostas perdas dessas empresas são meras lágrimas de crocodilo.
Não concordam? Corrijam-me, com o balanço contábil da gravadora na mão, provando que de fato o prejuízo ocorreu e que, portanto, elas se viram obrigadas a cortar custos.
- Qual parte da multa, se ela vier a ser paga, irá para os artistas (supostamente, as vítimas), e quanto irá para as gravadoras? Espero que, sendo os primeiros os maiores sofredores, eles receberão indenizações maiores.
Sobre a segunda parte:
- Na universidade onde estudo, há várias conexões wireless ABERTAS, SEM CONTROLE DE USUÁRIOS, como parte do seu programa de inclusão digital.
Se eu, ou qualquer outra pessoa, for lá fazer downloads, será ela a vítima da desconexão? Iria ser realmente interessante ver uma manchete Universidade Federal de Santa Maria tem sua conexão com a internet cortada.
Podemos generalizar essa situação para telecentros e empresas (embora, nesses casos, esperar-se-ia que o administrador de sistemas tomasse as devidas providências).
- Nessa mesma universidade, já vi funcionários baixando livros em horário de serviço usando máquinas funcionais. Novamente, será ela a desconectada? Como apontar o exato culpado do suposto crime?
- Como provar, no caso de uma conexão compartilhada por múltiplos usuários, que foi o usuário A e não B que fez os supostos downloads ilegais?
- Como poderá um provedor monitorar o tráfego sem causar prejuízos a todos os usuários, visto que tal operação exige tempo de processamento e banda e, portanto, gastos?
- Qual a justificativa para tamanha vista grossa perante os camelôs, que vendem produtos piratas e contrabandeados, ao mesmo tempo que há o urgente interesse em combater uma suposta ameaça que é o download?
- E, simplesmente, isso não seria PUNIR SEM JULGAMENTO, ou seja, pura e simplesmente algo inconstitucional? É exatamente igual a prender alguém por uma denúncia sem que haja provas, além de caracterizar violação de sigilo.
Várias perguntas que a grande mídia ignora, de forma a conseguir manter o estado de medo dos usuários mais desinformados (que, infelizmente, constituem a maioria). Assim sendo, recomendo simplesmente ignorar os comentários daqueles cujo interesse é justamente fabricar conteúdos de qualidade questionável, com o mero objetivo comercial, e tirar suas próprias conclusões como um usuário (e, na improvável hipótese das leis serem aprovadas, vítima em potencial da ganância - que, por sinal, pode ser relacionada direta ou indiretamente com toda a problemática atual - de um pequeno grupo).
E, antes que venham com a clássica pergunta e se fosse o seu trabalho?, faço questão de - sempre que possível - libertar qualquer coisa que eu produzi, produza ou venha a produzir sob licenças livres, como a Creative Commons e a GPLv3 (no caso de software), como uma forma de demonstrar minha insatisfação e ódio perante a opressão imposta pelos conglomerados produtores de "cultura", ou mesmo como forma de garantir que todos nós, sem discriminação financeira ou de educação, possamos ter a oportunidade de produzir, divulgar e remixar conhecimento.
Além disso, para os advogados ou simpatizantes que alegarem apologia à pirataria por minha parte, recomendo olharem atentamente os computadores e MP3 players dos computadores de seus filhos, familiares ou melhores amigos. E então, ainda querem penas extremas para quem faz downloads?
Se os programas P2P e os sites de compartilhamento causam a pirataria, então as colheres causam a obesidade. -- Renan Birck Pinheiro
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não são lidos e não me responsabilizo pelo conteúdo deles.